Em ofício dirigido ao STF, Moro diz que Lula quis intimidar a Justiça
Mesmo diante das evidências que afirma ter encontrado sobre o ex-presidente, o juiz federal afirma que não tem intenção de decretar a prisão preventiva do ex-presidente
atualizado
Compartilhar notícia
O ofício do juiz federal Sérgio Moro, enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (29/3) não se atém a pedidos de desculpas. No mesmo documento, que possui 30 páginas, Moro afirma que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quis “intimidar” e “obstruir” as investigações da Operação Lava Jato, da qual o magistrado é responsável. Para ele, a conduta de Lula configura em crime de obstrução à Justiça. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Foram 12 ligações que tiveram o sigilo rompido na Operação Aletheia, 24ª fase da Lava Jato que teve como alvo o ex-presidente. Elas foram divulgadas no dia 16 de março, um dia antes de Lula tomar posse como ministro da Casa Civil. No ofício enviado ao STF, Moro explica que a publicidade dos grampos “era a melhor maneira de prevenir novas condutas ou tentativas de obstrução ou intimidação da Justiça”.O juiz cita uma das ligações. Nela, o ex-presidente diz que “eles têm que ter medo”, em referência aos investigadores que buscam detalhes sobre suas negociações. Para Moro, Lula teria feito a afirmação “sem maiores pudores”.
Não se trata de uma afirmação que não gere naturais receios aos responsáveis pelos processos atinentes ao esquema criminoso da Petrobrás. Entendeu este Juízo que, nesse contexto, o pedido do Ministério Público Federal de levantamento do sigilo do processo se justificava exatamente para prevenir novas condutas do ex-presidente para obstruir a Justiça, influenciar indevidamente magistrados ou intimidar os responsáveis pelos processos atinentes ao esquema criminoso da Petrobrás. O propósito não foi, portanto, politico-partidário
Sérgio Moro, em ofício
Em outro grampo, o ex-presidente conversa com o Ministro da Fazenda Nelson Barbosa. Na gravação, Lula parece ser contra a ação da Receita Federal dentro do Instituto Lula e da LILS Eventos e Palestras, na qual o petista atuou em diversos momentos. Ele também afirma que a Receita deveria investigar emissoras de TV, como a Rede Globo, e outros políticos da oposição, como Fernando Henrique Cardoso. Para o juiz federal, Lula fez isso “buscando que este interferisse nas apurações que a Receita Federal, em auxílio às investigações na Operação Lava Jato, realiza em relação ao Instituto Lula e a sua empresa de palestras. A intenção foi percebida, aparentemente, pelo ministro da Fazenda que, além de ser evasivo, não se pronunciou acolhendo a referida solicitação”.
Porém, Moro também afirma que não há qualquer indício de que as autoridades de foro privilegiado envolvidas nos grampos tenham cometido algum crime. “Não há nos autos nenhuma prova ou indício de que as autoridades com foro por prerrogativa de função tenham cedido às solicitações indevidas dele, com o que também não havia causa para, por conta deles, remeter o processo ao Supremo Tribunal Federal”.
Mesmo diante as evidências que afirma ter encontrado sobre o ex-presidente, Moro diz que não tem intenção de decretar a prisão preventiva de Lula.
Mesmo no caso envolvendo o ex-presidente, apesar de todo esse contexto, de aparente intimidação, obstrução e tentativas de influenciar indevidamente magistrados, e não obstante toda a especulação a respeito, não havia sequer qualquer pedido de decretação de prisão cautelar do Ministério Público Federal contra o investigado, o que significa que medida drástica sequer estava em cogitação por parte deste Juízo
Sérgio Moro
Ao final, o juiz federal listou dez motivos por ter mantido a Operação Aletheia sob seus cuidados:
- A interceptação tinha justa causa e estava amparada na lei.
- A medida tinha por foco exclusivo condutas do ex-presidente e associados destituídos de foro por prerrogativa de função.
- Foram colhidos fortuitamente diálogos do ex-presidente com autoridades com foro por prerrogativa de função sem que estas tenham sido investigadas ou interceptadas.
- Foram colhidos diversos diálogos do ex-presidente com conteúdo jurídico-criminal relevantes por revelarem condutas ou tentativas de obstrução ou de intimidação da Justiça ou mesmo solicitações para influenciar indevidamente magistrados, sendo também colhidos diálogos relevantes para o objeto da investigação em curso, de fundada suspeita de ocultação de patrimônio em nome de pessoas interpostas.
- Não foram colhidas provas de condutas criminais dos interlocutores com foro por prerrogativa de função, inclusive de que algum deles teria aceito as solicitações do ex-presidente para obstruir, intimidar ou influenciar indevidamente magistrados.
- Roberto Teixeira (advogado de Lula) foi interceptado porque investigado, envolvido diretamente nos supostos crimes sob investigação, a suposta aquisição do sítio em Atibaia com utilização de pessoas interpostas, e não como advogado, não havendo imunidade, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, quando o advogado envolve-se em práticas criminosas.
- Foram juntados aos autos e, por conseguinte, publicizados apenas diálogos considerados juridicamente relevantes para a investigação criminal e os demais, quer protegidos por sigilo profissional ou eminentemente privados, foram resguardados em arquivos eletrônicos não publicizados e que deverão ser submetidos, após o contraditório, ao procedimento de inutilização.
- Há diálogos selecionados pela autoridade policial como relevantes e que parecem ser eminentemente privados, mas em realidade contém aspectos relevantes para a investigação, como aqueles que indicam que o sítio em Atibaia está no poder de disposição da família do ex-presidente e não do formal proprietário.
- A praxe deste Juízo sempre foi o de levantar o sigilo sobre processos de interceptação telefônica, inclusive para diálogos relevantes para a investigação, após o encerramento da diligência, o que não discrepa da prática adotada em outros Juízos e, aparentemente, também por este Egrégio Supremo Tribunal Federal, conforme, salvo melhor juízo, precedente acima referido.
- A competência, focada a investigação nas condutas do ex-presidente, para decidir sobre o pedido de levantamento de sigilo sobre o processo, que continha diálogos relevantes para investigação criminal de condutas do ex-presidente, era deste Juízo, em 16 de março, quando o ex-presidente não havia ainda tomado posse como Ministro (da Casa Civil).